Tomada desastrosa do Palácio da Justiça !
O
caso, ocorrido há 30 anos, nos dias 6 e 7 de novembro de 1985, teve como
principais personagens juízes, civis, um grupo guerrilheiro, o Exército, a
Polícia, o governo e, suspeita-se, o narcotráfico.
As
imagens do tanque no edifício foram vistas milhares e milhares de vezes na
Colômbia. No resto do mundo, muitos as viram pela primeira vez na série Narcos, do Netflix, no trecho que recria o episódio e
que faz referência a uma suposta colaboração entre os guerrilheiros e Pablo
Escobar.
Na
quarta-feira, 6 de novembro, 35 guerrilheiros do grupo M-19 tomaram o palácio
de Justiça, sede da Corte Suprema e do Conselho de Estado colombiano, matando
dois seguranças ao chegar ao edifício e mantendo como reféns as pessoas que se
encontravam nele.
O
Movimento 19 de Abril, ou M-19, nasceu em 1974, como reação ao que seus membros
consideravam fraude nas eleições de 19 de abril de 1970, em que foi derrotado o
candidato do movimento político ANAPO (ao qual pertenciam alguns os fundadores
do M-19).
A
atuação do grupo era mais urbana que a de outras guerrilhas como as Farc e a
ELN. O M-19 buscava constantemente a visibilidade, especialmente com golpes
espetaculares.
Em
1985, a guerrilha teria idealizado a tomada do palácio de Justiça como reação
ao que considerou falhas do governo do presidente Belisario Betancur em cumprir
os acordos de paz que havia assinado no ano anterior. Esse fracasso do processo
abalou uma trégua firmada entre o governo e a guerrilha em agosto de 1984.
"A
tomada do palácio de Justiça foi concebida como um 'golpe publicitário'
desenhado para retificar a história, impugnar o presidente e seu governo e
projetar-se ao poder em meio ao clamor popular que se levantaria em
seguida", diz a jornalista Ana Carrigan em seu famoso livro sobre o
episódio The Palace of Justice: a Colombian tragedy ("O palácio de Justiça: uma
tragédia colombiana", em tradução livre).
Mas
as coisas não ocorreram exatamente como o planejado.
Confronto sangrento
O edifício de quatro andares do
palácio de Justiça ficava – e ainda fica, agora reconstruído – em plena área
central de Bogotá, a metros do Congresso e da residência oficial do presidente.
Após a tomada do palácio pelos
guerrilheiros, o presidente Betancur, que estava em meio a reuniões com
embaixadores estrangeiros na sede do Executivo, recebeu a notícia de que as
Forças Militares invadiram o local, no qual estavam mais de 300 pessoas, entre
magistrados, funcionários, visitantes e guerrilheiros.
O
historiador americano David Bushnell escreveu sobre a reação das Forças
Armadas: "Aparentemente sem esperar ordens do presidente, o Exército
lançou um ataque contra o edifício". Os guerrilheiros pensaram que as
forças do Estado não comprometeriam a vida dos homens da lei, mas se enganaram.
Alguns acreditam,
seguindo a linha de Bushnell, que a reação militar se transformou em uma
espécie de golpe de Estado de dois dias.
Outros
atribuem a responsabilidade total a Betancur, que assim que terminou o
episódio, afirmou ter tido "controle absoluto da situação". Seu irmão
Jaime Betancur Cuartas, magistrado do Conselho de Estados, foi um dos reféns
que sobreviveu à tomada.
A
Comissão da Verdade colombiana, que publicou em 2009 seu relatório sobre o
caso, determinou que o governo nunca teve a intenção de salvar a vida dos
reféns.
O
relatório diz, inclusive, que o governo censurou informações sobre o que estava
ocorrendo, ordenando a partir do Ministério das Comunicações "a
transmissão de um jogo de futebol (na TV) enquanto o palácio era consumido
pelas chamas".
No
confronto morreram cerca de 100 pessoas, 12 delas magistrados, incluindo o
presidente da Suprema Corte, Alfonso Reyes Echandía.
Além disso, 11 pessoas desapareceram, todos funcionários da
cafeteria do prédio e visitantes. Os corpos de três delas, três mulheres, foram
identificados há algumas semanas, 30 anos depois de seu rastro ter se perdido.
Muitos ainda estão desaparecidos.
Foram, como disse na
época a revista colombiana Semana, "28 horas de
terror".
Durante o confronto entre a guerrilha e as forças de segurança,
o presidente Betancur não quis – ou não lhe permitiram – negociar com o M-19.
"A operação deixou a impressão – justificada ou injustificada – de que o
presidente recebia ordens dos militares, em vez de dá-las", diz Bushnell.
Reprodução leia na integra em: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/11/151105_narcos_palacio_justica_nc_cc